Diferentes tipos de treino na corrida


A corrida é tradicionalmente conhecida como um esporte democrático, devido ao mito da praticidade associado à prática dessa modalidade. Para começar, basta ter vontade, um tênis adequado e iniciar a corrida. No entanto, este pode ser um erro grave cometido por muitos corredores, pois correr sem orientação correta pode aumentar o risco de lesões ou até mesmo de frustrações, como estagnação, desestimulando a continuidade no esporte.

Dessa forma, para aqueles que acreditam que correr se resume a sair de casa correndo sem direção até onde as pernas suportarem, este artigo abordará alguns estilos de treino que proporcionam diferentes estímulos para o corpo, com o objetivo de informar corredores para que construam seus próprios treinos a partir do que já foi estabelecido e estudado na corrida.

Cada tipo de treino de corrida dentro de um plano de treinamento tem um propósito específico e oferece benefícios e riscos distintos. Essa compreensão pode ajudar o atleta a definir as intenções para cada tipo de corrida no plano de treinamento, permitindo obter o máximo de benefícios do esforço investido. O resultado? Melhor condicionamento físico, menor risco de lesões e tempos de corrida mais rápidos.

 

#1: Corridas Base

As corridas de base são realizadas em um ritmo confortável, de baixa intensidade, o que significa que não devem deixar o atleta exausto. A ideia é treinar sem causar muito estresse ao corpo, permitindo que ele se recupere e se adapte ao longo do tempo.

As corridas de base compõem a maior parte da quilometragem semanal de um corredor, especialmente no início dos períodos de treinamento específico para uma prova ou no começo da temporada, momento em que é necessário recondicionar o corpo para os estímulos de maior exigência.

Em geral, as corridas de base são utilizadas para acumular distância e tempo de corrida, aumentando gradualmente a resistência. Essas corridas aeróbicas desenvolvem o condicionamento cardiovascular e fortalecem músculos, ossos e tecidos conjuntivos para lidar com as forças e demandas da corrida. Além disso, elas condicionam as vias metabólicas aeróbicas para queimar gordura e carboidratos como fontes de energia e ajudam no processo de aumentar gradualmente o volume total de quilometragem.

 

#2: Corridas de Recuperação

Uma corrida de recuperação é uma atividade de baixa intensidade e esforço leve, normalmente realizada dentro de 24 horas após uma corrida ou treino intenso. Como o nome sugere, as corridas de recuperação ajudam o corpo a se regenerar após treinos extenuantes e desgastantes. O objetivo é manter o coração bombeando e os músculos em movimento para aumentar a circulação e auxiliar na recuperação sem sobrecarregar ainda mais o organismo.

Durante as corridas de recuperação, é essencial que o corredor passe no "teste da conversa", o que significa estar correndo em um ritmo suficientemente leve para sustentar uma conversa completa enquanto corre. Isso deve representar um esforço de 1-3 em uma escala de 1-10, em que 10 corresponde ao esforço máximo.

Como o objetivo não é sobrecarregar o corpo, essas corridas devem ser relativamente curtas. A maioria dos corredores deve buscar uma duração de 20-60 minutos ou uma distância de cerca de 3-10 km, dependendo do nível de condicionamento físico, da quilometragem semanal e da distância da corrida para a qual está treinando.

 

#3: Longão

Os longos são exatamente o que o nome sugere: corridas de longa distância que excedem a quilometragem diária típica, com o objetivo de aumentar a resistência cardiovascular e muscular, a resistência mental e os sistemas de energia aeróbica para enfrentar a distância da corrida alvo.

Essas corridas são geralmente realizadas em um ritmo confortável e de conversação, pois o foco é aumentar a capacidade aeróbica. A maioria dos treinadores de corrida recomenda que a frequência cardíaca seja mantida em torno de 70% do máximo durante os longos. Alguns corredores mais avançados podem incorporar treinos intervalados em alguns de seus longos, dependendo de suas metas de corrida.

A maioria dos planos de treinamento inclui um longão por semana, com a distância aumentando gradualmente na maioria das semanas, e com algumas semanas de redução na distância para evitar o overtraining.

 

#4: Treinos de Limiar

As corridas em ritmo limiar têm o objetivo de melhorar o limiar de lactato. Esse limiar é o ponto em que o corpo começa a acumular lactato mais rapidamente do que pode eliminar.

Os treinos de limiar são realizados a um ritmo que corresponde a aproximadamente 83-88% do VO2 máximo. Este ritmo é aquele que o corredor pode manter em esforço máximo por cerca de uma hora. A estrutura desses treinos frequentemente inclui intervalos que variam de 5 a 20 minutos, com períodos de recuperação entre eles.

O foco desses treinos é treinar o corpo para lidar com a produção rápida de lactato e melhorar a capacidade de eliminá-lo. Isso permite ao corredor sustentar ritmos mais rápidos por mais tempo. Embora esses treinos também desafiem a resistência mental, o foco é mais específico na capacidade de manter um ritmo intenso quando o corpo está começando a acumular lactato e sentir fadiga.

 

#5: Tempo Run

As corridas de tempo são projetadas para melhorar a capacidade do corredor de sustentar um ritmo rápido por um período prolongado. Esse tipo de treino também visa aumentar a resistência mental e a economia de corrida. Durante essas corridas, o corredor mantém um ritmo ligeiramente mais lento do que o ritmo de limiar, mas ainda desafiador. Este ritmo é aquele que pode ser sustentado confortavelmente por cerca de uma hora.

Os treinos de tempo geralmente envolvem corridas contínuas que duram entre 20 a 40 minutos ou mais, sem pausas significativas. O foco é condicionar o sistema metabólico para lidar com a produção e eliminação de subprodutos metabólicos, como o lactato. Esse processo ajuda a melhorar a eficiência na corrida e a capacidade de manter um ritmo intenso por mais tempo.

Além disso, as corridas de tempo desafiam a resistência mental, ajudando o corredor a se acostumar com a sensação de desconforto. Isso permite que o corredor mantenha um ritmo constante mesmo sob fadiga.

 

#6: Corridas Progressivas

As corridas progressivas são semelhantes às corridas base, mas com o objetivo de aumentar gradualmente o ritmo e a intensidade ao longo da corrida.

Por exemplo, durante uma corrida progressiva de 10km, começa-se no ritmo confortável. No quilômetro 3 a 5, o ritmo é acelerado para o ritmo de meia maratona. Em seguida, durante os quilômetros 5 a 8, o ritmo é ajustado para o de 10km. Finalmente, os últimos quilômetros são corridos no ritmo de 5km.

Essas corridas progressivas treinam o corpo para aumentar o ritmo mesmo quando a fadiga se instala. Além disso, esse tipo de treino desenvolve a força mental e a resistência, ajudando o corredor a manter a intensidade crescente ao longo do tempo.

 

#7: Repetições em Subida

As repetições em subida são sprints de alta intensidade realizados em uma colina.

Os corredores podem optar por uma colina curta e íngreme, que pode ser percorrida em 20 a 30 segundos, ou uma colina mais longa, que pode levar de um a vários minutos para ser escalada. A escolha da inclinação e do comprimento da colina depende das metas de corrida do corredor.

Ao correr em uma inclinação íngreme, os corredores enfrentam a força da gravidade, o que torna o sprint em subida mais desafiador do que percorrer a mesma distância em terreno plano.

Os treinos em subida são eficazes no desenvolvimento de velocidade e força. Frequentemente, os treinadores de corrida se referem a esses treinos como “treinamento de força disfarçado” porque trabalhar contra a resistência da inclinação exige maior ativação e geração de força dos músculos.

 

#8: Treinos Intervalados

Os treinos intervalados na pista envolvem correr distâncias específicas em ritmos determinados com o objetivo de treinar para correr mais rápido, familiarizar-se com diferentes ritmos e melhorar o condicionamento físico. Esses treinos são projetados para melhorar a eficiência cardiovascular e a capacidade anaeróbica.

Quando um corredor realiza intervalos intensos, o corpo é exposto a níveis elevados de demanda cardiovascular e muscular em períodos curtos, seguidos por períodos de recuperação. Esse tipo de treinamento melhora a capacidade do sistema cardiovascular de fornecer oxigênio para os músculos durante exercícios intensos e aumenta a eficiência do corpo em utilizar esse oxigênio. Além disso, os intervalos ajudam a melhorar a capacidade anaeróbica, permitindo que o corpo produza energia sem depender exclusivamente do oxigênio, o que é crucial para sustentar ritmos mais rápidos.

Exemplos de treinos intervalados incluem sprints de 400 metros, 500 metros, 600 metros, e podem variar até 3 quilômetros, em alguns casos, até 5 quilômetros, ou até mais dependendo do objetivo e nível do atleta. Esses treinos são realizados com descansos curtos entre os intervalos e ritmos intensos durante as repetições.

 

#9: Corridas Fartlek

Fartlek é um termo sueco que significa "jogo de velocidade". As corridas fartlek são uma forma de treino de velocidade que, embora semelhantes aos treinos intervalados, oferecem uma estrutura mais flexível e podem ser realizadas em trilhas, estradas ou outros percursos de corrida, em vez de na pista.

O principal benefício do fartlek é a melhora da resistência cardiovascular. Alternando entre estímulos mais intensos e moderados durante o treino, o fartlek estimula o sistema cardiovascular, fortalece o coração e aumenta a capacidade de transporte de oxigênio para os músculos. Esse tipo de treino também promove adaptações musculares, melhorando a capacidade dos músculos de gerar força e resistir à fadiga.

Em vez de ter uma distância fixa para cada intervalo, uma corrida fartlek pode ser baseada em tempo ou em marcos arbitrários para indicar o início e o fim dos esforços intensos. Não há paradas entre os intervalos; o corredor ajusta o ritmo entre os períodos de recuperação e os períodos "ativos".

Por exemplo, um corredor pode fazer um treino fartlek que envolve um aquecimento de dois quilômetros, seguido de 10 repetições de 90 segundos no ritmo de 5K com 60 segundos de trote de recuperação entre cada intervalo, e finaliza com um desaquecimento de 1 quilômetro.

Para um corredor iniciante, um treino fartlek pode consistir em caminhar por 5 minutos, depois correr de um sinal de rua até o próximo, e caminhar até o próximo sinal de rua. Quando o próximo sinal de rua for alcançado, o corredor começa a correr novamente até o sinal de rua seguinte, e assim por diante.

 

#10: Sprints

Os sprints podem ajudar a aumentar a velocidade de corrida ao melhorar a cadência ou o ritmo. Geralmente realizados no final de um treino, os sprints são acelerações curtas, variando de 50 a 200 metros, e devem ser executados em velocidades quase máximas. Correr a essas intensidades treina o sistema neuromuscular para lidar com ritmos rápidos de forma controlada e coordenada, promovendo adaptações que melhoram a velocidade e a eficiência na corrida.

 

Referências:

  1. Kavaliauskas, M., Jakeman, J., & Babraj, J. (2018). Early Adaptations to a Two-Week Uphill Run Sprint Interval Training and Cycle Sprint Interval Training. Sports, 6(3), 72
  2. Burgess, D. J., & Lentz, C. (2012). High-Intensity Interval Training for Health and Fitness. Routledge.
  3. Laursen, P. B., & Jenkins, D. G. (2002). The Scientific Basis for High-Intensity Interval Training.
  4. Noakes, T. D. (2003). The Lore of Running.
  5. Jones, A. M., & Daniels, J. (2008). The Physiology of Running.
  6. Scovel, R. (2010). Tempo Runs and Their Role in Distance Running.
  7. Magness, C. (2012). Running Science.
  8. Melzer, R. (2015). The Science of Running Hills.
  9. Bailey, S. (2014). The Effectiveness of Sprint Training in Distance Runners.
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